Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte

CONCURSO; LICENCIATURA; MESTRADO; GRAU ACADÉMICO SUPERIOR AO EXIGIDO; EXCLUSÃO;  LEI GERAL DO TRABALHO EM FUNÇÕES PÚBLICAS

Processo: 00434/18.4BEPNF Data do Acórdão: 29-03-2019

CONCURSO; LICENCIATURA; MESTRADO; GRAU ACADÉMICO SUPERIOR AO EXIGIDO; EXCLUSÃO; ARTIGO 86º, Nº 1, ALÍNEA C), DO ANEXO DA LEI GERAL DO TRABALHO EM FUNÇÕES PÚBLICAS; LEI Nº 112/2017, DE 29.12

Sumário:

  1. Não se pode ser excluído de um concurso em que é exigido, entre outros requisitos, o grau de licenciatura, por deter grau académico superior, face ao disposto no artigo 86º, nº 1, alínea c), do anexo da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas.
  2. É ilegal o aviso de abertura de concurso, tendo em vista o preenchimento de sete postos de trabalho para a carreira e categoria de técnico superior, na área funcional de desporto e juventude, num município, aberto ao abrigo do regime instituído pela Lei nº 112/2017, de 29.12, ilegalidade que afecta o acto que, com base nas normas desse aviso, excluiu o autor, detentor do grau de mestre na referida área. *

http://www.dgsi.pt/jtcn.nsf/89d1c0288c2dd49c802575c8003279c7/a6d3ee47abd75a3380258407004a9000?OpenDocument

O Município T... veio interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL do saneador-sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, de 21.12.2018, pelo qual foi julgada procedente a presente acção administrativa que PNTC move contra o Recorrente e, consequentemente, anulou o acto de exclusão do procedimento que nestes autos vem impugnado; mais julgando prejudicado o conhecimento da questão relativa à inconstitucionalidade do ponto 6.2 do aviso de abertura.
Invocou para tanto, em síntese, que a decisão recorrida interpreta erradamente o artigo 86º, nº 1, alínea c), da Lei do Trabalho em Funções Públicas, na medida em que o aviso de abertura apenas admite detentores de licenciatura na área do desporto, que o Recorrido não detém, na sequência de que não juntou o documento comprovativo de tal requisito exigido no referido aviso; que a letra e o espírito da lei revelam que o legislador deu margem de discricionariedade à entidade empregadora para decidir se para preencher lugar correspondente ao Grau 3 exija a titularidade de licenciatura ou exija grau académico superior a esta; que o Decreto-Lei nº 74/2006, de 24.03, faz a distinção do grau académico de licenciatura (artigo 5º e seguintes) e do grau de mestrado (artigo 15º e seguintes) e conclui que ambos estes graus têm natureza diversa e autónoma, sendo específicas para cada um deles, as exigências e procedimentos da respetiva obtenção; que o artigo 17º, nº 3, deste diploma ao dispor que o reconhecimento a que se referem as alíneas b) a d), do nº 1, tem como efeito apenas o acesso ao ciclo de estudos condicente ao grau de mestre e não confere ao seu titular a equivalência do grau de mestre ao de licenciatura, bem como impede que se possa considerar que o grau de mestre engloba ou consome o grau de licenciatura; não havendo uma hierarquização na atribuição e obtenção dos graus académicos até porque de acordo com o nº 2, alínea d), desse normativo, podem candidatar-se ao grau de mestre meros detentores de um currículo escolar, científico ou profissional, que seja reconhecido como atestando capacidade para realização deste ciclo de estudos pelo órgão científico estatutariamente competente do estabelecimento de ensino superior onde pretendem ser admitidos

(…)

2 - O grau de mestre é conferido numa especialidade, podendo, quando necessário, as especialidades ser desdobradas em áreas de especialização.”
Dúvidas não subsistem de que o grau de mestre é superior ao grau de licenciado, havendo distinção dos dois graus académicos, apresentando o grau de mestre valências e capacidades a adquirir manifestamente superiores às exigidas para a licenciatura.
Ora, é com fundamento neste excesso de capacidades que se exclui o Recorrido do presente procedimento concursal.

A licenciatura, o mestrado e o doutoramento são três ciclos de estudos conferentes de grau, pressupondo um certo encadeamento entre os três graus.
O nível de exigência é escalonado em função do grau a que o aluno se propõe, conforme já evidenciado na diferença abissal entre as capacidades adquiridas na licenciatura e no mestrado.

Tanto assim, que para o acesso e ingresso no ciclo de estudos condicente ao grau de mestre, a alínea a) do nº 1 do artigo 17º do DL nº 74/2006, exige a titularidade do “grau de licenciado ou equivalente legal”.
Do mesmo modo, prescreve o artigo 30º, nº 1, alínea a), que pode candidatar-se ao acesso ao ciclo de estudos conducente ao grau de doutor “os titulares do grau de mestre ou equivalente legal”.

Acresce que seria absurdo que o Autor detentor indiscutivelmente de mestrado respeitante à área de desporto não pudesse candidatar-se ao procedimento em mérito, que recruta técnicos de ensino superior, ou seja, que alguém com qualificações inferiores pudesse aceder a determinada carreira, mas que esse acesso pudesse ser vedado a alguém que obteve e é detentor de grau académico superior.

Assim sendo, o Autor, titular do grau de mestre, reunia as condições para concorrer ao concurso em mérito, na medida em que se tratava de um concurso para a carreira de técnico superior, resultando ilegal o ponto do aviso que apenas previa a licenciatura, por afrontar o disposto na lei em matéria de acesso à respectiva carreira, desconsiderando as habilitações académicas do candidato.
O facto do Autor não ter apresentado o documento comprovativo da licenciatura é ultrapassado pela apresentação do documento da titularidade do mestrado.
Deve, por isso, ser anulado o acto, com fundamento na errada aplicação dos critérios legais subjacentes ao acesso à carreira de técnico superior.
Não merece, pois, provimento o presente recurso jurisdicional, impondo-se manter a decisão recorrida