Universidades não tencionam para já tornar obrigatórios os testes à covid-19

O PÚBLICO contactou alguns responsáveis de instituições de ensino superior. Há quem considere que a resolução evocada pelo ministério de Manuel Heitor não é suficientemente clara no sentido de, querendo-o, as reitorias poderem obrigar alunos a fazer testes à covid-19 nas universidades.

Tornar os testes de diagnóstico de SARS-CoV-2 obrigatórios no seio da comunidade que frequenta o ensino superior não está, neste momento, no horizonte de diferentes responsáveis de universidades contactados pelo PÚBLICO.

Apesar de os reitores também terem recebido esta semana uma nota do Ministério da Ciência, Tecnologia e do Ensino Superior na qual se lembra que “a resolução do Conselho de Ministros n.º 45-C/2021, de 30 de Abril, na sua redacção actual”, prevê a “possibilidade de estarem sujeitos à realização de testes de diagnóstico de SARS-CoV-2 os trabalhadores, estudantes e visitantes de instituições de ensino superior e atribui ao respectivo dirigente máximo a competência para o determinar”, não parece haver, neste momento, pelo menos junto de alguns responsáveis do ensino superior, vontade de dar passos no sentido dessa obrigatoriedade.

O reitor da Universidade de Coimbra (UC), Amílcar Falcão, nem considera, aliás, a resolução suficientemente clara. Mas, mesmo admitindo que abra a porta para que um reitor, querendo, possa determinar a realização de testes, sob pena de um estudante, por exemplo, não poder entrar nas instalações, diz não o querer fazer: “Não vou obrigar a não ser que seja obrigado. Se o Governo me disser que os reitores são obrigados a obrigar, sim, mas caso contrário não vou obrigar. A UC recomenda, mas não obriga.”

Esta é a posição que mantém mesmo que os jovens, com o passar do tempo, estejam “a aderir menos, no geral,” à testagem efectuada nesta universidade. Além dos jovens, tal também se verifica, por exemplo, entre os funcionários que começaram a ser vacinados, nota o reitor.

Amílcar Falcão ressalva que a UC mantém “testagem não obrigatória, mas mais frequente” nas residências e um rastreio diário, aleatório e voluntário, desde o início do ano lectivo. Se, em Setembro de 2020, a adesão aos testes estava na “ordem dos 70% a 80%”, com cerca de 120 a 140 testes diários, depois do segundo confinamento e de as actividades presenciais nestas instituições terem sido retomadas, a testagem foi reforçada, mas a adesão diminuiu: “Chamamos cerca de 1000 pessoas por dia, mas só aparecem cerca de metade, cerca de 40% a 50%; nos estudantes até deverá ser só um terço”, nota.

Também o reitor da Universidade de Lisboa, António Cruz Serra, não pondera tornar os testes obrigatórios: “Vamos continuar a fazer os testes como sempre fizemos. Os estudantes estão a terminar o ano lectivo, com aulas presenciais reduzidas. Agora, nesta altura, nota-se que, de facto, alguns estudantes recebem a convocatória para o teste e, ou porque estão em modo remoto nas aulas, ou porque se deslocam menos à universidade, acabam por fazer menos testes, mas suspeito que, agora, com o aumento de casos em Lisboa, a preocupação deverá aumentar e a adesão dos jovens também.”

Não diz ser contra a ideia, mas para já a resolução não lhe parece suficiente para avançar com essa obrigatoriedade e entende que a situação neste momento não o justifica, o que não quer dizer que, no futuro, e havendo uma determinação legal mais robusta nesse sentido, tal não deva acontecer, diz.

Reunião na qual se discutirá o tema

Apesar de ressalvar não se ter ainda documentado o suficiente sobre a resolução em causa, o vice-reitor da Universidade Nova para a área da saúde, José Fragata, admite que pode estar em causa uma reserva do direito de admissão mediante teste negativo, determinada pelo dirigente máximo. “Se as condições nas universidades alguma vez estiverem de modo que isso possa determinado terá de ser avaliado em sede própria que é a reitoria, mas neste momento não sentimos ainda essa necessidade”, afirma.

Apesar de admitir que a situação pandémica é dinâmica, nota que, actualmente, nesta universidade, os jovens continuam a aderir à testagem, num quadro que se mantém estável. De qualquer forma, e sempre ressalvando que não sentem, neste momento, “necessidade” de avançar com esse “tipo de medidas”, atenderão à “determinação que contempla um cenário que, a agravar-se”, pode levar a reitoria a “determinar a realização de um teste, desde que tal seja enquadrado legalmente”. O PÚBLICO pediu um comentário ao presidente do Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas, mas não obteve resposta em tempo útil.

Já o presidente do Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos (CCISP), Pedro Dominguinhos, avança que o tema será abordado em reunião: “Teremos reunião do CCISP na terça-feira e iremos abordar esta temática. Independentemente de podermos definir uma orientação global, dependente do risco em cada um dos territórios, a resolução reforça a capacidade de podermos intervir de forma mais assertiva, se for esse o entendimento. Com o comunicado do ministério, temos uma legitimidade adicional de fazer com que os estudantes realizem os testes de forma obrigatória, mas cada instituição terá autonomia para definir a prática de cada uma das instituições.”

Mas o que diz, afinal, a resolução citada pelo ministério de Manuel Heitor? No artigo relativo à “realização de testes de diagnóstico de SARS-CoV-2” lê-se que podem ser sujeitos à realização dos mesmos, entre outros, “os trabalhadores, estudantes e visitantes” das “instituições de ensino superior” e que “a realização de testes de diagnóstico de SARS-CoV-2” é “determinada pelo responsável máximo do respectivo estabelecimento”. Na nota enviada pela tutela, informa-se igualmente que se encontra “em curso uma operação de reforço de testagem nas instituições de ensino superior localizadas no concelho de Lisboa tendo em vista a identificação atempada de potenciais infecções”.

Recentemente alguns dirigentes de instituições do ensino superior alertaram para uma quebra na adesão dos estudantes à testagem. Na Universidade de Lisboa, a adesão imediata dos estudantes convocados para testagem passou de dois terços para um terço (no início da testagem no ano passado, mais de dois terços respondiam logo que sim à convocatória, agora essa adesão passou para um terço). “Quando fazemos uma convocação a 100 estudantes, cerca de 33% respondem de imediato e os outros não. Isto mostra alguma resistência que existe neste momento à testagem. A resistência tem sido crescente, e é sobretudo da parte dos jovens”, disse, na altura, o vice-reitor da Universidade de Lisboa, ressalvando, no entanto, que os outros dois terços são convocados novamente.

Também Pedro Dominguinhos dava conta de uma diminuição, pelo menos no Politécnico de Setúbal: “A única coisa que nos está a preocupar é a baixa adesão aos testes que são gratuitos, está na ordem dos 15% neste momento, não ultrapassa esse valor, todas as semanas enviamos cerca de mil marcações e só cerca de 150 respondem positivamente para fazer o teste. Nas três primeiras semanas depois do regresso presencial às aulas era maior, rondava os 70%.”

Maria João Lopes - 29 de Maio de 2021 Público