O ministro do Ensino Superior defendeu esta quinta-feira no parlamento que as valorizações salariais dos docentes decorrem das suas avaliações, o que a maioria dos partidos entende que viola a lei do Orçamento.

O ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Manuel Heitor, esteve esta quinta-feira no parlamento por requerimento do PCP, para falar sobre a questão das valorizações remuneratórias dos docentes do ensino superior, e defendeu que a questão dos pagamentos e da forma como se devem processar "é um não problema", afirmando que a lei é clara.

Em causa está o artigo 18.º da Lei do Orçamento do Estado para 2018, que determina que para os trabalhadores em funções públicas o pagamento das progressões decorre de uma contagem de pontos, atribuindo um ponto por cada ano, sendo necessário 10 pontos para progredir um escalão na carreira, o que foi aplicado nas carreiras gerais.

No entanto, o ministro defendeu perante os deputados que "só deve ser aplicada uma situação de pontos quando não há avaliação", e que no caso dos docentes do ensino superior, que têm uma carreira especial, essa situação não se põe, porque é dever das instituições terem um regime de avaliação instituído, devendo aplicar-se o previsto no Estatuto da Carreira Docente Universitária, o qual define que os professores do ensino superior progridam sempre que sejam avaliados com seis excelentes consecutivos.

O ministro ficou isolado a defender esta interpretação da lei, que para o governante deve ter em conta os diferentes regimes e regulamentos em vigor, e a remeter para a autonomia das instituições, e dos regimes de avaliação que aplicam, a definição dos professores que devem progredir na carreira de acordo com os resultados obtidos nas avaliações, e excecionalmente, na ausência de avaliação, com base no sistema de pontos.

PCP, Bloco de Esquerda (BE), PSD e CDS-PP puseram em causa essa interpretação da lei, afirmando que a Lei do Orçamento do Estado se sobrepõe hierarquicamente a regulamentos internos de instituições, pelo que deve prevalecer a aplicação de valorizações de acordo com o sistema de pontos, sob pena de se criar uma situação de injustiça entre quem foi e quem não foi avaliado.

"Decorre que estar numa carreira especial é pior do que estar numa carreira geral. Decorre também que ser avaliado é pior do que não ser avaliado", defendeu a deputada do CDS-PP Ana Rita Bessa, que disse também que as informações chegadas ao parlamento indicam que em muitas instituições não foi feita avaliação.

Pelo lado do PCP Ana Mesquita disse que estão a ser criadas "desigualdades entre trabalhadores" e pediu ao ministro que explicasse claramente o critério a ser usado para definir as valorizações remuneratórias a aplicar, acusando depois Manuel Heitor de ter optado pelo critério que abrangia um menor número de professores para garantir uma redução de despesa e de "forma perniciosa utilizar a avaliação para penalizar a maioria dos professores", dizendo que "a instrumentalização que é feita é absolutamente inadmissível".

O social-democrata Pedro Alves também acusou o Governo de usar o ensino superior para atingir metas do défice e Álvaro Baptista, também do PSD, afirmou que o partido não irá aceitar que haja docentes do superior tratados de forma diferente.

Insistindo na separação entre carreiras gerais e carreiras especiais, o ministro Manuel Heitor defendeu que as valorizações salariais em causa dizem respeito a dois triénios de avaliação - de 2010 a 2012 e de 2013 a 2015, sendo que o que inclui 2018 ainda decorre - e que as transferências feitas para as instituições para pagamento de acréscimos salariais tiveram por base esses anos.

Em resposta a estas afirmações, o deputado do BE Luís Monteiro disse ser "uma mentira" que as progressões remuneratórias aconteçam por triénios e acusou o ministro de ter ido ao parlamento "lavar as suas mãos com a autonomia das instituições".

"Se assume que são os dois últimos triénios tem que o assumir politicamente e tem que contrariar o Orçamento do Estado", disse Luís Monteiro, fazendo eco da posição da maioria dos grupos parlamentares, que acusaram o ministro e o Governo de não cumprir a lei.

"Porque é que o Governo não cumpre a lei, a sua lei? É a pergunta mais simples que lhe posso colocar", disse a social-democrata Nilza de Sena, dirigindo-se ao ministro.

O ministro afirmou-se espantado com as posições dos deputados, que acusou de estarem a pôr em causa a avaliação dos docentes, o que motivou um coro de críticas e pedidos de esclarecimento, tendo o deputado Luís Monteiro devolvido as acusações, dizendo que era a diferenciação criada com a interpretação que o Governo fez da lei que colocava em causa a avaliação.

"Quer maior ataque à avaliação dos docentes do que este, de dizer que os que são avaliados são prejudicados? O senhor ministro continua em toda a audição a insistir que isto não é um problema político, e que a lei está a ser cumprida. Não está, senhor ministro", disse.

Jornal de Notícias 19 Julho 2018