FALTA POR DOENÇA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo

Sumário:

A ausência de norma especial que se refira aos efeitos das faltas por motivo de doença dos trabalhadores integrados no regime de proteção social convergente relativamente ao direito a férias, em conjugação com o disposto no artigo 15.º da Lei n.º 35/2014, de 20 de junho, especificamente dedicado às faltas por doença, impõe, de acordo com os ditames da interpretação jurídica, a conclusão de que as faltas por doença daqueles trabalhadores ainda que superiores a 30 dias não determinam quaisquer efeitos sobre as férias.

Processo: 0109/17

Data do Acordão: 28-09-2017

Relator: ANA PAULA PORTELA

  1. O MINISTÉRIO DA JUSTIÇA interpõe recurso de revista para o STA do acórdão do TCAS de 20/10/2016 que negou provimento ao recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Arbitral, proferida em 26/11/2015, que julgou procedente o pedido de A…………, de declaração de nulidade ou de anulação do acto de 10.2.2015, da Directora da Unidade dos Recursos Humanos e Relações Públicas da Polícia Judiciária, que lhe aplicara a suspensão do vínculo de emprego público, e inerente repercussão nas férias, anulando o acto impugnado, por violação dos art.s 278º, nº 1, 129º, nºs 1 e 2 e 127º da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas e art. 15º nº 1 da Lei nº 35/2014, de 20.7.

(…)

Tenhamos então presente, para além da literalidade do preceito, a razão de ser inerente à situação que urge interpretar assim como o elemento sistemático de unidade do sistema jurídico.

O art. 15.º da Lei n.º 35/2014, de 20 de Junho, estabelece o regime de faltas por doença dos trabalhadores integrados no regime de protecção social convergente, mas nada diz sobre o regime de suspensão do vínculo de emprego público estabelecido nos art.s 276º a 279º da LTFP.

Mas, o art. 14º do mesmo já dissera, sob a epígrafe:

“Normas aplicáveis aos trabalhadores integrados no regime de proteção social convergente”

“O disposto nos artigos 15.º a 41.º é aplicável aos trabalhadores integrados no regime de proteção social convergente”.

Pelo que, expressamente não há qualquer referência à aplicabilidade dos referidos artigos 278º, 129º e 127º da LTPF.

Por outro lado, o artigo 19.º da Lei n° 59/2008, alterado nomeadamente pela Lei n° 66/2012 e depois pela Lei n.º 68/2013, de 29/08, e revogado pela Lei 35/2014, aqui em causa, determinava a aplicação do preceito sobre suspensão do contrato no caso de faltas por doença superior a 1 mês (ainda que só após a entrada em vigor da regulamentação específica a aprovar) com efeitos no direito a férias.

Na verdade, dispunha o art. 19º do referido diploma que aprovava o regime do contrato de trabalho em funções públicas e que foi revogado pela Lei 35/2014 de 20/6: (…)

Ou seja, estava expressamente previsto o regime que o aqui recorrente pretende ser aplicável e deixou de o estar face ao diploma que o revogou e onde se insere o referido art. 15º que aqui cumpre interpretar, o qual rege uma ampla previsão de situações.

Pelo que temos de concluir que a falta de previsão de uma norma com esse conteúdo significa tão simplesmente que não se pretendeu incluí-la, antes se visando que a falta por motivo de doença devidamente comprovada não afetasse qualquer direito do trabalhador, e nomeadamente qualquer efeito sobre as férias, com excepção do aí expressamente previsto.

Não podemos, assim, dizer que o facto de o referido artigo 15º não aludir à suspensão do vínculo de emprego público por impedimento não imputável ao trabalhador que se prolongue por mais de 1 mês (omitindo tal questão), tal significa que continuaria em vigor o regime de suspensão do artigo 278.° da LTFP e por consequência os seus efeitos no direito a férias nos termos dos artigos 127º e 129.° da LTFP.

É que, não aludindo este preceito a quaisquer efeitos no direito a férias, e não sendo este nenhum dos direitos do trabalhador afectado nos termos dos números 2 a 9 do artigo 15°, temos de concluir que as faltas por doença dos trabalhadores integrados no regime de protecção social convergente, ainda que superiores a 30 dias, não determinam quaisquer efeitos sobre as férias, não se aplicando, por isso, o disposto nos artigos 129.° e 127.° da LGTFP, que afectam precisamente o direito a férias.

E assim deve ser, sob pena de se estar a admitir a afectação do direito a férias, o que o legislador não previu, antes expressamente referindo que não seriam afectados quaisquer direitos dos trabalhadores para além dos aí expressamente previstos.

E, referindo o próprio nº6 deste preceito que as faltas por doença podem ultrapassar os 30 dias seguidos (embora com perda de antiguidade) tal também significa que não ocorreu qualquer suspensão nos termos do artigo 278.°, n.° 1, da LTFP do regime geral do vínculo de emprego público, para os trabalhadores integrados no regime de protecção social convergente, como ocorre para os trabalhadores integrados no regime geral já que, havendo suspensão do vínculo, não continuariam a contar dias de faltas por doença.

Não estamos, pois, perante uma situação de suspensão do vínculo nos termos do artigo 278° da LGTFP, e também não são aqui aplicáveis os artigos 129° e 127°.

Em suma, a ausência de norma especial que se refira aos efeitos das faltas por motivo de doença dos trabalhadores integrados no regime de proteção social convergente relativamente ao direito a férias, em conjugação com o disposto no artigo 15.º da Lei n.º 35/2014, de 20 de junho, que é especificamente dedicado às faltas por doença, impõe, de acordo com os ditames da interpretação jurídica, a conclusão de que as faltas por doença daqueles trabalhadores ainda que superiores a 30 dias não determinam quaisquer efeitos sobre as férias.

Em face de todo o exposto acordam os juízes deste STA em negar provimento ao recurso e manter a decisão recorrida.

  http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/dee6138ca8e6217a802581ad0054c240?OpenDocument&Highlight=0,FERIAS,FALTAS,DOEN%C3%87A